Mulher coragem
"Promessas e mais promessas.
Muitas.
Depois o silêncio. Mas...mas...
"Mas o quê? Estou aqui, não estou?"
Não.
Nunca estiveste.
Desde o início. A tua insegurança necessitava sempre da aprovação do ventre estéril de mulher velha e seca, nunca parida nem amada.
E tu deixavas-te enganar.
Ela prometeu-te a lua.
Tu acreditaste.
Ela vendeu a lua e prometeu-te um asteróide.
Tu acreditaste.
Ela desfez o asteróide e prometeu-te o pó.
Tu acreditaste.
E nós, que nunca fomos nós?
E nós, que nunca existimos?
E nós, que não tínhamos os nossos sonhos e planos. Só os dela. Cada vez mais velha, seca e amarga.
Cada vez mais "matriarca".
Cansei-me desta relíquia bolorenta e manipuladora.
Fartei-me da figurinha seca e insignificante que manobrava na sombra.
Porque tive de casar com ela também?
E também me cansei de não seres Homem.
Achei rídicula toda a tua pose, gabarolices, vaidades, tráfico de influências que nunca tiveste...e entravas em casa sempre de bochechas descaídas, vencido da vida, mais uma vez desempregado a exigir-me sacrifícios.
E eu cumpria.
Mas por dentro, tinha vergonha de ti.
Vergonha de tanta vaidade sem razão.
Vergonha de não assentares.
Vergonha de não cresceres, de pensares que bastava o nome de um antepassado para te abrir a vida.
Vergonha da nossa vida fingida.
E cansei-me de não seres Homem.
Cansei-me de ti e do teu silêncio.
Cansei-me de nunca me dizeres que era importante na tua vida.
Cansei-me de nunca me dizeres que tinha feito algo bem.
Cansei-me de ser tratada como se fosse a pessoa mais estúpida do mundo.
Cansei-me de ser usada por ti.
Cansei-me de procurar Amor onde só havia um ser oco e cuja vaidade eu alimentava.
Fartei-me da tua necessidade de aprovação da eterna maquiavélica relíquia.
Fartei-me de não ter futuro.
Desesperei de ouvir "não te chega?"...quando até tinha de pagar as prendas que me davas...a gozar, carrinhos de brinquedo. Ou da pulseira que me entregaste num embrulho desfeito por outro alguém...Não sabes, mas nunca a usei, não era para mim. Tu não sabes que eu sei.
E o teu ar engravatado de importante, fresco pela manhã...depois de noites vazias...nada...nada...nada!
Cansei-me de estar casada sem o estar.
Sem companheiro que se esforçasse por mim.
Sem um ombro amigo.
Cansei-me de te ver derramado no sofá em frente da TV.
Cansei-me dos teus pés que não paravas de esfregar!
Cansei-me de seres gordo ...e vaidoso.
Cansei-me do teu ar de superioridade, como se detivesses a verdade universal...e depois lá ias, de orelha murcha, pedir mais uma benção à titi-relíquia.
E tinha vergonha de ti por seres diferente e indiferente.
Cansei-me das noites sem nada.
Cansei-me da lingerie, dos perfumes e das velas...para nada!
Cansei-me da comida picante, exótica e erótica...para nada!
Cansei-me de passar as noites sozinha na tua digestão do jantar...
Cansei-me de não ter manhãs de domingo.
Cansei-me da minha solidão presa num casamento que nunca o foi.
Acabou por fim!
Ironia: tenho de agradecer esta libertação à relíquia, que sempre quis desfazer este nó e por fim conseguiu.
Tu, figura oca de vaidade, vira a página e segue a tua vida.
Eu estou farta de ser virgem!"
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